segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Desencanto

Não foi bem assim, mas imagine acordar um dia e perceber que o mundo perdeu todo o encanto. Imaginou? Que triste esse mundo não é mesmo? Um mundo sem nenhuma graça: inodoro, incolor, insípido, indolor, inaudível, inabitável ... enfim insuportável! Um mundo cruel e sem mascaras! Como seria acordar num mundo onde os últimos bastiões do encantamento, a fé e a esperança, tenham sido derrubados? Você pode me dizer como seria?
Bem, como eu disse, não foi bem assim que o mundo caiu das nuvens! Não foi de repente que as luzes se apagaram! Foi um lento e gradual processo de desencantamento do mundo! Onde a utopia deu lugar ao cinismo e o coração virou pedra.
Ao poucos a percepção de que as pessoas estão a cada dia que passa mais egocentradas, pensando apenas no eu e no meu! A falta de empatia com as minorias e com as pessoas mais pobres; a crescente intolerância ao diferente, a completa falta de pejo diante da desigualdade, do cinismo e da canalhice e cretinice. Tudo isso doí no peito e na alma! Bateu tão pesado quando percebi que a maioria que se silencia diante da falta de humanidade, se silencia porque está ficado cada vez mais desumana.
Aos poucos a coisificação do mundo  e das pessoas que nos cercam, essa reificação de tudo que é fugidio, livre, impermanente e mutável, torna o mundo uma coisa triste e inevitável.
Se tudo é rígido, sólido e perene a história termina e as coisas são como são e pronto. Sem chance para os sujeitos, somos todos objetos nas mãos do destino inexorável das coisas.
Que saudade do Quintana que dizia em Das Utopias: 
"Se as coisas são inatingíveis... ora!

Não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos, se não fora
A presença distante das estrelas!"  
In: Mario Quintana , Espelho Mágico. Porto Alegre: Editora Globo.1951.
Que saudade do Drummond de Procurar o Que: 
"Eu tropeço no possível, e não desisto de fazer a descoberta do que tem dentro da casca do impossível"
In: Carlos Drummond de Andrade, Boitempo I.
Que saudade do mundo que ansiava pela descoberta, pela inovação, que se indignava contra as injustiças do mundo, que ia para as ruas quebrar os portões do instituído pra fazer um instituinte mais belo e feroz!
Nesses tempos em que os debaixo não tem vez e nem sonho, ou melhor só sonham em ter o mesmo que os de cima, serem os de cima; me assusta não o pragmatismo, mas o cinismo e a cretinice!
Tudo bem sonhar em ter algo melhor, mas as custas do sofrimento dos demais! Isso é um demais pra minha sensibilidade roqueir@! Um mundo onde o privilegio é o direito e o direito é o privilegio, uma inversão absurda que não ofende mais ninguém! Ou será que ofende? Já não sei e até duvido!
O que eu sei é que o desencantamento do mundo e o fim das utopias feriram de morte meu senso ético e estético. É tudo muito feio e patético: Trump, Temer,  Bolsonaro, Jean-Marie Le Pen, Béla Kovács ... essa turma, hoje, me assusta!
Adoraria estar enganado, mas duvido muito que nos próximos cinquenta anos, o cenário se modifique! 
Como estou quase lá  nos cinquenta, isso significa que terei que viver mais de cem anos para ver a nova primavera florir, que longo e tenebroso inverno! 





segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

Dias mais Escuros

Tem dias que são mais escuros
Onde a dor bate mais forte
Tem dias sem muita sorte
Onde tudo dá errado!

Você pede perdão e trégua,
Mas a tempestade não para!
Só resta resistir ao castigo
Tudo o que sobra é procurar abrigo

Todos apontam os dedos,
Mas ninguém estende às mãos
Todos enxergam teus defeitos
Ninguém vê a tua solidão.

A multidão segue como gado
Aquele que não segue é estranhado,
Estrangeiro em seu próprio tempo,
Em seu lugar um forasteiro!

Criminoso por ser diferente
Estranho no mar das gentes
Ninguém estranha o familiar
Mesmo que seja noite em céu solar

Quem é o cego? Aquele que vê?
Quem o crente? O que não crê?
Tão estranho esse habitual
Parece um antigo e triste ritual
Onde os fracos são ceifados
E os fortes são isolados!
Onde a regra é o antolho
Pra sempre continuar o fluxo

Tenho cicatrizes de atropelamento
Tenho uma amargura que não cura
A  boca azeda nestes dias mais escuros
Os ossos doem onde foi quebrado

Mesmo que ninguém mais veja
Ainda ando contra a corrente
E mesmo que ninguém me ouça
Grito sinais de alerta e lanço sementes
... sementes de rebelião ao vento
Na esperança de que brotem no deserto
Dessas mentes vazias e cobiçosas,
No vazio preenchido por egocentrismo

Ninguém vê a saída
E seguem como manada
Vara de porcos possuídos
Rumando ao precipício

Quem em sã consciência
Rumaria sorrindo a perdição!
Nesses dias perco a paciência
E me jogo contra a multidão!
Tiro, porrada e bomba!
Socos e pernadas em profusão!
tudo inútil, tentativa desesperada,
de chamar a atenção
Ninguém me ouve
ninguém me vê